Em Portugal, no Século 17, por exemplo, vamos encontrar Josefa de Óbidos, ou Josefa de Ayala (1634?-1684). Esta artista nasceu em Sevilha (Espanha), filha do pintor português Baltazar Gomes Figueira, com quem aprendeu os segredos da arte.
Sua mãe era D. Catarina de Ayalla y Cabrera, irmã do pintor sevilhano Barnabé de Ayalla. Bem cedo, sua família mudou-se para Óbidos (Portugal), onde Josefa passou a maior parte de sua vida, sendo, pois, mais conhecida como Josefa de Óbidos.
Curioso é que, havendo sido aceita como pintora na sociedade fechada de sua época, Josefa veio a sofrer restrições feitas por críticos dos Séculos 19 e 20, que consideravam sua pintura bem inferior à dos seus contemporâneos.
Exceções à parte, a verdade é que, até o final do Século 19, torna-se difícil encontrar mulheres que tenham se aventurado em um território em que não eram bem vistas e do qual a própria família procurava mantê-las afastadas.
Não que, à mulher, a pintura fosse proibida. Se oportunidade surgisse, seu aprendizado até recebia incentivos, mas restrito ao ambiente familiar, fazendo parte das prendas domésticas, juntamente com o bordado e as aulas de piano. Expor seus trabalhos, conquistar mercado e galgar a fama, nem pensar nisso.
Em 1816, a Missão Francesa veio ao Brasil para implantar uma Academia de Belas-Artes. Problemas políticos, sobretudo a desconfiança política em relação aos franceses, retardaram o projeto por dez anos e somente em 5 de novembro de 1826 é que instalou-se oficialmente a Real Academia de Desenho, Pintura, Escultura e Arquitetura Civil, hoje conhecida como Escola Nacional de Belas-Artes.
Nesse lapso de 10 anos, as aulas se davam em caráter informal, não havendo entretanto registros de que alguma mulher tenha participado delas. Como também não se tem registro, nos anos seguintes, de mulheres que tenham estudado na Academia e, muito menos, que tenham exposto obras nos Salões de fim de ano.
A Arte, para a mulher, continuava restrita ao lar.
A abertura dos Salões anuais, na Academia, era uma grande festa, com a presença do Imperador, dos professores, alunos, críticos de arte e convidados. Depois de um longo discurso do diretor, passava-se à entrega dos prêmios, seguindo os critérios bastante conservadores da comissão julgadora, com registro em ata.
Pois é na leitura dessas atas que vamos encontrar a presença feminina se insinuando, a partir dos anos 70. Em 1876, Francisca Breves ganha a 2ª Medalha de Ouro e Elvira Airosa fica com Menção Honrosa.
Em 1884, a medalha de ouro é entregue a Abigail de Andrade; Guilhermina Tolistadius e Julieta Adelaide dos Santos recebem menção honrosa. Sem qualquer título, são citadas também, de passagem, as pintoras Rosa Merys, Maria Teixeira de Farias e a baronesa de Araújo Gondin.
A partir de 1894, a presença de mulheres nas premiações passa a ser uma constante, quase sempre com simples menção honrosa de 1º e 2º graus.
Existem, porém, exceções. Em 1900, por exemplo, Julieta França ganha o cobiçado prêmio de viagem ao exterior e torna-se pensionista da República. Em 1905, Ana Vasco e Maria Vasco, alunas de Benno Treidel e participantes de seguidas exposições, ganham a medalha de prata. O mesmo acontece com Georgina de Albuquerque em 1912 e 1916. Maria Pardos e Sílvia Meyer também conquistam esse prêmio em 1915.
No mais, outros nomes vem citados, mas tão somente com menções honrosas, nível em que nomes de mulheres chegam a competir, em número, com concorrentes masculinos.
A partir de 1917, um incidente viria mudar tudo. Ninguém, nem o mais experiente profissional do mundo das artes, poderia prever os acontecimentos desse ano, envolvendo de um lado a pintora Anita Malfatti e, de outro, o escritor Monteiro Lobato.
Anita trazia consigo uma vasta bagagem cultural. Filha de pintora, recebeu da mãe os primeiros ensinamentos sobre a arte.
Em 1910, foi para a Alemanha, onde estudou na Academia Real e, posteriormente, teve contato com o Expressionismo e tomou aulas com os mestres revolucionários de então. Em 1915, foi aos Estados Unidos, onde adquiriu plena liberdade de se expressar com tintas e pincéis.
De volta ao Brasil, incentivada pelo crítico Nestor Rangel Pestana e instigada por Di Cavalcanti, inaugurou sua exposição de um único dia no Mappin Stores, onde vendeu alguns quadros e ficou conhecendo seu amigo de toda a vida, o escritor Mário de Andrade.
Quando tudo parecia caminhar bem, eis que explode o artigo de Monteiro Lobato, publicado no O Estado de S. Paulo, com o título: Paranóia ou Mistificação?
A carga pesada de Lobato contra os modernistas, centrada exclusivamente em Anita – o alvo mais próximo naquele momento – minou a confiança da pintora em seu trabalho, deixando seqüelas irremediáveis, como sintetizou Mário de Andrade: "Ela fraquejou, sua mão indecisa se perdeu."
Anita sofreu o desgaste, mas a exposição de 1917 foi o elemento de coesão de todos os modernistas, resultando na Semana de Arte Moderna em 1922, da qual participaram Anita, com 12 obras e a pintora Zina Aita, com 8 quadros.
A arte moderna livrava-se das limitações impostas pela crítica conservadora; a mulher passava a ter presença atuante na pintura e, com os ventos do Modernismo, surgia um dos grandes fenômenos de todos os tempos da pintura brasileira: Tarsila do Amaral, que não participou da Semana por achar-se fora do Brasil.
O espaço estava conquistado, as barreiras foram se rompendo e a pintura, acadêmica ou moderna, passou a ser uma atividade de dois gêneros.
Acabaram-se as limitações quanto ao sexo e permanecem tão somente as limitações do mercado, comuns a homens e mulheres, e que somente serão superadas na medida em que se tornem fortes os mercados regionais, não suficientemente explorados, seja por falta de apoio oficial, seja porque as atenções de todos se voltam, erroneamente, só para o eixo Rio-São Paulo.
ABAPORU DE TARSILA DO AMARAL |
OPERÁRIOS DE (TARSILA) |
VENDEDOR DE (TARSILA) |
TELA DE ZINA AITA |
FOTO DE ZINA AITA |
TELA DA ANITA MALFATTI |
TELA DA ANITA MALFATTI |
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