sábado, 15 de setembro de 2012

Grandes Pintores Brasileiros

Benedito Calixto


Artista que, ao lado de Almeida Júnior e Pedro Alexandrino, completa a tríade mais representativa das tendências pictóricas em São Paulo nos fins do Séc. XIX e começos do XX.

Contato com a arte européia

     Benedito Calixto nasceu a 14 de outubro de 1853 na Vila de Nossa Senhora da Conceição de Itanhaem, e adolescente transferiu-se para Brotas, onde pintou seus quadros iniciais. Incentivado pelos encômios, realizou em 1881 sua primeira exposição, na sede do Correio Paulistano, em São Paulo. O insucesso da mostra fê-lo abandonar para sempre a capital e buscar refúgio em São Vicente, onde viveria praticamente o resto da existência e construiria boa parte de sua obra.

     Dois anos depois da má estréia paulistana, surgiu a Calixto a oportunidade de estudar seriamente em Paris, a convite e a expensas do Visconde de Vergueiro. O pintor, embora casado desde 1877, parte sozinho para a França, freqüenta sem maiores motivações o ateliê de Raffaelli, cuja arte não aprecia, e pouco depois transfere-se à Academia Julian, como aluno de Boulanger, Lefebvre e Tony-Robert Fleury.

     De Paris segue até Lisboa, onde por muito pouco tempo recebe aulas de Silva Porto, tendo ainda freqüentado o ateliê de Malhoa.

Índios ao vivo, no fundo do quintal

     Retornando ao Brasil em 1885, Calixto é rigorosamente o mesmo de quando embarcou: imune a influências, impermeável ao fascínio cultural da capital francesa, permanece até o fim um isolado, praticando um tipo de pintura do qual não se arredaria um milímetro, alheio a qualquer inovação ou renovação.

     Quando descansa da pintura, é no passado histórico de São Paulo que se refugia, ou então se volta para as estrelas, em sua paixão de astrônomo amador.

     Esse amor excessivo à História seria aliás nocivo ao artista, que com escrúpulos de documentarista chegará a povoar de indígenas o quintal de sua casa, a fim de mais fielmente pintar A Fundação de São Vicente, e que fincaria no mesmo local gigantesco mastro, para ter uma idéia mais real de como seriam as naus de Martim Afonso de Sousa, quando aportou em 1532 a São Vicente.

A arte industrializada

     Outro fator negativo a conspirar contra a arte de Calixto foi o elevado número de encomendas a que teve sempre de atender. Já Vítor Meireles, em fins do século passado, referira-se ao "afogadilho com que pensa e à rapidez com que executa o que pensa", acrescentando que, vivesse acaso Calixto no Rio, tentaria corrigi-lo, "obrigando-o a pintar um trabalho grande, durante dois ou três anos".

     Para os últimos anos de vida, sobretudo, transformara-se Calixto numa autêntica máquina de fazer quadros, como se pode observar desse trecho de uma carta remetida em maio de 1919 a um comerciante que se incumbia de lhe vender a produção:

     «Peço-lhe o favor de tomar nota das pessoas que querem outros quadros, a fim de que as mesmas se expliquem sobre o tamanho e o gênero que desejam, bem como o ponto ou lugar que devo reproduzir.»

     Na mesma carta, desencantado, acrescenta:

     «Pouco ou nada me adianta, agora que já estou velho, a opinião e conselho dos críticos sobre meus trabalhos. Desejaria apenas, que os jornais dessem notícias dos quadros vendidos, etc., e mais nada, pois não preciso de reclame.» Pedrina, filha e clone

     Foi o isolamento em que viveu Calixto que o impediu de participar com freqüência do Salão Nacional de Belas Artes, em cujos catálogos o seu nome surge apenas duas vezes, em 1898 (medalha de ouro de terceira classe) e em 1900. Também por isso não tomou parte, senão raramente, de certames internacionais, como a Exposição de Saint-Louis de 1904, na qual conquistou também medalha de ouro.

     Mesmo escondido em São Vicente, nunca deixou de ser prestigiado, como o comprovam os clientes e o avultado número de alunos, a começar por sua própria filha, Pedrina Calixto Henriques, cuja pintura aliás é subsidiária da sua, a ponto de muitas obras de sua autoria terem sido metamorfoseadas inescrupulosamente em originais do pai; tarefa aliás muito simples porque, além do mais, a artista assinava-se apenas P. Calixto, bastando um traço recurvo ao P inicial para que surgisse a assinatura mais prestigiosa.

Pintura multifacetada

     Calixto foi pintor de marinhas, paisagens, costumes populares, cenas históricas e religiosas. Se durante a sua vida a tendência era considerá-lo acima de tudo como pintor de história e religioso (gêneros esses nos quais deixou abundante produção, inclusive na Catedral e na Bolsa de Santos, no Palácio Cardinalício do Rio de Janeiro, na Igreja de Santa Cecília em São Paulo e na Matriz de São João Batista em Bocaina), hoje costuma-se conceder bem maior importância às cenas portuárias e litorâneas, nas quais extravasa um caráter talvez rude, mas pessoal e profundamente sincero na abordagem dos diversos aspectos da natureza.

     Os quadros em que fixou o desembarque do café, no primitivo porto de Santos, ao lado do seu aspecto puramente documental, revestem-se de força expressiva, apesar da aparência algo dura das embarcações; por outro lado, convém destacar certas cenas litorâneas ou ribeirinhas, em que a um desenho algo ingênuo e a um colorido preciso aliam-se uma nítida preocupação atmosférica e um grande respeito ao meio ambiente.

     O artista faleceu a 31 de maio de 1927, em São Paulo, tendo sido porém enterrado no Cemitério de Paquetá, em São Vicente. Três anos antes, recebera do Papa Pio IX a comenda e a cruz de São Silvestre Papa, em recompensa aos serviços prestados à Igreja com sua arte.

Benedito Calixto















                                                         Batista da Costa





Batista da Costa é um exemplo da força do destino, do poder irrefreável do talento e da atração irresistível que o futuro exerce sobre o ser humano. Nasceu na semi-indigência e, para piorar as coisas, seus pais morreram quando era apenas menino. Irriquieto e indisciplinado, largou a tutela de seus tios e foi pedir asilo em um orfanato para menores desamparados, onde era obrigado a se submeter a uma disciplina ainda maior, tendo inclusive de usar uma farda que o identificava como órfão.

     Pois foi nesse abrigo que seu talento começou a ser observado e incentivado e, aos 12 anos de idade,  o matricularam na Academia de Belas Artes do Rio de Janeiro, onde concluiu o curso, seis anos depois.

     Daí para diante, a carreira de Batista da Costa foi meteórica: reiniciou os estudos com Almeida Júnior, que já havia sido seu professor na academia; recebeu bolsa de estudos e passou nove anos na França, estudando com os melhores mestres; voltando ao Brasil viu coroados seus esforços, ao ser nomeado professor e, mais tarde, diretor da Escola Nacional de Belas Artes, tendo entre seus alunos o jovem iniciante Cândido Portinari. (Paulo Victorino)

Texto do livro de Laudelino Freire:
Um Século de Pintura (1816-1916)

     [João Batista da Costa], paisagista, é, nesta especialidade, a individualidade mais acentuadamente artística que possuímos.

     Os que mais nela se distinguiram (Félix Emílio, Agostinho da Mota, Augusto Muller, Vinet, Langerok, Vasquez, Caron, Parlagreco e outros) nenhum se lhes iguala na revelação de qualidades de interpretação, colorido, sentimento e objetividade, ao transportar para a tela o cenário brasileiro. Nenhum o excedeu na sinceridade com que interpreta as infinitas nuanças do nosso verde, das nossas árvores, das nossas florestas, das nossas paisagens, sempre cheias de luz, de tons, de brilho e indizíveis encantos, nem da sobriedade, no sentimento e na fidelidade com que se sabe reproduzir.

     Possui, como nenhum outro pintor brasileiro, o supremo poder de sentir a realidade e transmiti-la completa. Ao grande artista, tem cabido o maior sucesso nas exposições anuais. Nelas percorreu toda escala de recompensas, desde o prêmio de viagem, logo conquistado na exposição inaugural, até a medalha de honra, somente a ele conferida até hoje.

     É natural do Estado do Rio de Janeiro, nascido a 24 de novembro de 1865. Iniciou seus estudos no Asilo de Menores Desamparados, hoje Instituto Profissional Masculino, de que também é professor [1916].

     Em 1885, transferiu-se para a Escola, onde foi discípulo de Sousa Lobo, J. Medeiros, Zeferino e Amoedo.

     Esteve na Europa de 1894 a 1897, matriculado no Ateliê Julian, em Paris. Percorreu as principais cidades européias, tendo visitado os mais importantes museus. Concluiu o tempo de pensionista na ilha de Capri, de onde regressou em 1898.

      A sua mais brilhante reprodução está representada nas paisagens Fim de jornada, premiada com a primeira medalha de outo; Quaresmas, da Pinacoteca de São Paulo; Tranqüilidade, [propriedade] de Laudelino Freire; Saudoso Recanto, casa em que residiu o Barão do Rio Branco, em Petrópolis; A Prisioneira, [propriedade] do Dr. Artur Lemos; Para a pesca. [propriedade] do Dr. Osvaldo Cruz; Idílio rústico, [propriedade] do Dr. Emílio Grandmasson; A caminho do curral, da Galeria Nacional; Manhã no alto da serra de Petrópolis, entre muitas outras.

     Merecem destaque, igualmente, Em repouso, com a qual alcançou o prêmio de viagem; Um transe doloroso, premiado com a terceira medalha de ouro; os Retratos de Prudente de Morais, Azevedo Lima, Rodrigues Alves, Sá Freire, Francisco Sales; Pouca pressa, do Dr. Augusto de Freitas, etc.

João Baptista da Costa
     Escolhido em 1906 para professor de pintura da Escola, foi reconduzido em 1911. Em 1915, foi nomeado diretor, em substituição de Rodolfo Bernardelli.










                                               

                                                         Antônio Parreiras


  Antônio Parreiras é natural de São Domingos, Niterói, Estado do Rio de Janeiro. Estudou com Jorge Grimm, juntamente com Hipólito Caron, Vasquez e Ribeiro. Muito cedo se tornou independente nos estudos, que os fez por si.

     Artista de superior talento, tem tido uma carreira original, sempre isolado consigo mesmo, cheio de audácia, invencível no esforço e com espantosa capacidade de trabalho. A sua obra é vastíssima, desordenada, cheia, alternadamente, de luminosidades e descaimentos, correspondentes à sua natureza impulsiva.

     É um artista sui-generis em nosso meio: combatido e invejado, mas nunca esmorecido. Tem feito entre nós cerca de trinta exposições dos seus trabalhos, afora as que tem feito no estrangeiro. É um vitorioso na colocação de seus quadros, podendo-se adiantar que é, talvez, o mais abastado dos pintores nacionais e um dos raros que tem vivido dos resultados da sua arte. Viaja continuamente pelo estrangeiro e tem, além do daqui, um ateliê em París, onde várias vezes concorreu ao Salão.

Tem tentado todos os gêneros. Começou por ser paisagista, dando-nos interessantes quadros, como seja o seu Sertanejas. Mais tarde, depois de ter viajado para a Itália, fez-se pintor animalista, produzindo Ovelha Ferida, Esperando o anzol, Morte do Pastor, Carro de bois, etc.; fez-se pintor de costumes, como o atestam Carnaval na roça, Lar infeliz, Saudades, Tormenta, Recordações do passado, Arte e miséria.

Passou, em seguida, a pintar o nu, dando-nos Fantasia, Pirinéia, Dolorida, Flor brasileira e Nonchanlance [Displicência]; e, finalmente, hei-lo pintor histórico, com as telas Conquista do Amazonas, Fundação de Niteroi, Fundação do Rio de Janeiro, Fundação de São Paulo, Proclamação da República Riograndense, e outros.

Além dos já referidos, conhecemos: Pescador de traíras, Vencido, Aretusa, Morte de Estácio de Sá, A tarde, Depois da trovoada, Funeral em São Doná, Pescadores do Adriático, Turbínio, Parque abandonado, Brejal, Final da Tragédia, Praia de Icaraí e outros.


Antônio Parreiras

















                                                         




Pedro Américo


    A pequena cidade de Areia, do Estado da Paraíba [AREIA PB, cid. (17.687 hab.) e mun. (28.140 hab.; 143 km2). Microrregião Brejo Paraibano.], nasceu Pedro Américo, a 29 de abril de 1843. Descendente de família de artistas, teve ainda, em proveito da precocidade das suas aptidões, o esmero de uma educação que foi diretamente iniciada por seu próprio pai, o violinista Daniel Eduardo de Figueiredo, que, "instruindo-o nas primeiras letras e rudimentos da música, procurava contemporaneamente satisfazer-lhe a sede de saber e desenvolver-lhe a vocação, cada dia mais acentuada, para o desenho, pondo-lhe nas mãos a biografia dos mais célebres pintores, ou livros e fragmentos que lhe pareciam ser apropriados ao preparo intelectual do seu caro filho."

     Dentro em pouco, eram conhecidas na cidade paraibana as manifestações do gênio do pequeno Américo, que todos admiravam com verdadeiro espanto.

   "Em fins de 1852, chegou a Areia, em missão exploradora, o naturalista francês Louis Jacques Brunet, homem de grande ilustração e amigo de Leverrier, de Lamartine, de Dumas pai e outras celebridades da ciência e das letras. Ouvindo falar tanto e com tamanha admiração do pequeno Pedro Américo, quis conhecê-lo pessoalmente e foi procurá-lo à casa paterna.

     "Tinha o precoce desenhador menos de dez anos; sua timidez habitual cedeu prestes o lugar à confiança que lhe inspiraram as maneiras insinuantes e as palavras bondosas do sábio explorador, assim como ao interesse que, no seu juvenil espírito, despertou uma pequena coleção de gravuras - cópias de quadros célebres -, que lhe mostrara o estrangeiro, e que ele pôs-se a contemplar cheio de pasmo.

     "Depois de examinar atentamente diversas paisagens e retratos feitos pelo pequeno, quis o Sr. Brunet certificar-se da verdadeira habilidade deste, para o que, fê-lo desenhar, do natural, um chapéu, uma espingarda e diversos outros objetos, que Pedro Américo reproduziu fielmente. Então, manifestou o naturalista o desenho de levá-lo em sua companhia como auxiliar, cujo concurso ser-lhe-ia precioso para os estudos que ia empreender.

     "Como era natural, sentiu-se o Sr. Daniel Eduardo lisonjeado, mas de certo não acreditaria na sinceridade daquela proposta se, poucos dias depois, não fosse consultado pelo presidente da Província, Dr. Sá e Albuquerque, a respeito do seu consentimento na nomeação de Pedro Américo para desenhador da comissão exploradora, da qual era chefe aquele distinto naturalista.

     "Quando Pedro Américo soube da notícia e do consentimento paterno, - diz Luís Guimarães Júnior - sentiu-se crescer cinco palmos, de súbito. - Explorar a província!, exclamava ele consigo, sem poder dormir uma hora, na véspera da partida. Ver árvores que nunca vi; grotas escuras e cheias de rumores desconhecidos; pássaros novos, cantos, harmonias, borboletas, mistérios da natureza luxuosa e esplêndida! - No desempenho dessa missão, que durou vinte meses, atravessou, com o Sr. Brunet, que se tornara seu amigo e apreciador, toda a província da Paraíba e parte das de Pernambuco, Ceará, Rio Grande do Norte e Piauí.

      "Em dezembro de 1854, chegava Pedro Américo à cidade do Rio de Janeiro, obtendo matrícula no Colégio Pedro 2º, por intermédio do Visconde do Bom Retiro. No ano seguinte, iniciou na Academia o seu curso de arte. Aí, o jovem paraibano chamou logo sobre si a atenção geral, tanto pela extraordinária inteligência, quanto pela assiduidade e grande aplicação...

     "Na Academia, foram incrivelmente rápidos os seus progressos; não se passou, talvez, um dia, sem que as mais robustas provas de um talento superior deixassem de aumentar o grande conceito em que era tido por mestres e condiscípulos, ou novos triunfos de enriquecer o seu cabedal de glórias escolares.

     "No fim desse tirocínio inicial, possuía o estudante, como troféus de legítimas vitórias, quinze medalhas de ouro e prata e diversos diplomas de aprovações com louvor, prêmios obtidos em exames brilhantes ou em concurso com os colegas."

     Enquanto estudante, pintou vários retratos e quadros, sobressaindo o Jesus da Cana Verde, São Miguel, São Pedro ressuscitando a filha de Tabira, etc.

     Em fins de 1859, seguiu para a Europa, onde se demorou até 1864, tendo freqüentado a Academia de Belas Artes de París, o Instituto de Física de Ganot e a Universidade de Sorbonne, onde foi discípulo de Ingres, [INGRES (Dominique), pintor francês (Montauban, 1780 – Paris, 1867). Aluno de David, distinguiu-se pela pureza de seu desenho. Principais obras: La Source, A Capela Sistina, O voto de Luís XIII, A apoteose de Homero, A odalisca, O banho turco.] Léon Coignet, Flandrin e Horace Vernet.

     Depois de ter permanecido em Paris três anos e meio, visitou muitas outras capitais européias. Estando outra vez em Paris, aí encontrou ordem para voltar ao Brasil, e a comunicação de ter concluído o tempo da pensão que lhe dava o Imperador.

     "Chegando em 1864 ao Rio de Janeiro, alistou-se logo Pedro Américo no número dos que disputavam a cadeira de desenho, que lhe foi concedida no meio de um concerto de louvores do corpo docente acadêmico, do público, e de seus próprios contendores. A sua tela - Sócrates afastando Alcebíades dos braços do vício - atesta ainda a legitimidade desse triunfo.

     "Cumpre registrar uma curiosa e rara ocorrência motivada por esse concurso, diz Luís Guimarães. O mais distinto dos pretendentes à disputada cadeira, o Sr. Le Chevrel, vendo o quadro de Pedro Américo, declarou-se imediatamente vencido, e disse aos juizes e examinadores quea escolha devia unicamente recair sobre o autor da Carioca."

     Nessa época, pintou, além de outros trabalhos, o Petrus ad Vincula, pertencente à Igreja de São Pedro, no Rio de Janeiro, diversos retratos, e deu os últimos toques na Carioca. Em 1865, voltou para a Europa e, durante essa sua nova estada nos centros europeus, pintou o - São Marcos, a Visão de São Paulo e a Cabeça de São Jerônimo, além de outros quadros.

     Defendeu teses em Bruxelas, o grau de doutor em Ciências Naturais, depois de ter sido aprovado "com grande distinção, em exame público que durou cinco horas. A solene cerimônia, que se realizou na presença do Cônsul do Brasil, foi narrada pelo Diário Oficial, o Independência Belga, o Eco do Parlamento e outros jornais, em termos honrosíssimos para o laureado paraibano, cujo primeiro pensamento, depois da vitória, foi regressar ao Brasil, onde iria exercer o seu magistério na Academia de Belas Artes.

     Ainda a propósito da sua defesa de tese, transcrevemos, do excelente trabalho do Dr. Cardoso de Oliveira, que tanto aqui nos tem servido, o seguinte: "O Diário Oficial Belga de 16 de janeiro de 1868, assim noticiou o fato, que assumiu as proporções de um grande acontecimento no mundo científico de Bruxelas, em um honroso artigo que foi transcrito pelos outros jornais do País:

"Um publico numeroso assistia, quarta-feira última, na sala magna da Academia da Universidade Livre, à defesa pública de uma tese apresentada pelo Sr. Pedro Américo de Figueiredo e Melo, doutor em Ciências Naturais... Quer na exposição, quer na discussão do seu trabalho, o candidato deu provas de um talento muito notável, que lhe valeram, por muitas vezes, aplausos do auditório. Decidiu, pois, a Faculdade das Ciências, por unanimidade, que o Sr. Pedro Américo de Figueiredo e Melo passara essa prova com a maior distinção, e conferindo-lhe, em conseqüência, o grau de adjunto à Universidade de Bruxelas."

     De regresso ao Brasil, passou em Lisboa, em fins de 1869, hospedou-se na casa de Porto-Alegre, então cônsul brasileiro naquela cidade, realizando o seu consórcio com uma das filhas daquele cônsul. Em começo de 1870, chegou ao Rio, entregando-se ao exercício da sua cadeira.

     O período de 1870 a 1873 foi o da sua maior fecundidade artística. Pintou a Batalha do Campo Grande, tela que figurou na Exposição Universal de Viena e pertence ao Ministério da Guerra, no Brasil; Ataque da Ilha do Carvalho, os retratos de D. Pedro 1º e D. Pedro 2º, por encomenda do presidente do Senado, o retrato eqüestre do Duque de Caxias, a Ondina, e muitas outras telas.

     A 19 de agosto de 1872, o então ministro do Império, conselheiro João Alfredo, contratou com o artista a execução de um grande quadro alusivo a qualquer dos grandes feitos de nossa história.

[ALFREDO (João Alfredo Correia De Oliveira, dito Conselheiro João), político brasileiro (Goiana, PE, 1835 - Rio de Janeiro, 1919). Formado em Direito (1858), foi deputado em sua cidade (1859) e presidente das províncias do Pará e de São Paulo (1861). Deputado em quatro legislaturas, senador (1877), ministro do Império (1871-1875 e 1877), presidente do Conselho e organizador do gabinete de 1888, que aboliu a escravidão no Brasil. Na República, foi diretor do Banco do Brasil.]

     Pintou então, Pedro Américo, o esboço da Batalha do Avaí, cujo quadro definitivo só pôde ser concluído em 1877, em Florença, Itália, onde foi exposto. O artista, tendo saído do Brasil em 1873, só chegou àquela cidade em 1874, depois de ter permanecido meses em Lisboa.

     Ao mesmo tempo em que trabalhava no seu grande quadro, pintou o episódio do Passo da Pátria. A Batalha do Avaí, diz o seu biógrafo, é incontestavelmente uma obra prima do mestre brasileiro; e, no conceito universal, uma das mais notáveis da arte moderna.

     Contemplaram-na, já bastante adiantada, os mais ilustres artistas e publicistas de quase todo o mundo, reunidos em Florença, em 1875, durante as festas comemorativas do centenário de Michelangelo, e voltavam para os seus respectivos países espalhando a fama de Pedro Américo, que eles também tinham ouvido discursar em duas línguas estrangeiras, diante do Mausoleu e do Davi do grande florentino.

     Desde o Neva até o Prata, celebraram os prelos a excelência do painel e os méritos de seu autor, em centenares de artigos, alguns dos quais firmados por autorizados escritores, proclamaram o pintor da Batalha do Avaí: um mestre inatingível, de incomparável talento, o mais dotado e importante pintor dos nossos tempos e o chefe da atual escola idealista da Europa. -

     O governo italiano ratificou este alto juízo, mandando colocar na sala dos pintores célebres da "Galleria Nazzionale degli Uffizzi" o retrato de Pedro Américo, exigindo que fosse feito por ele próprio. Por uma feliz coincidência, tocou-lhe ficar colocado entre os de Ingres e Flandrin, seus antigos mestres em Paris. O ministro da Instrução Pública da Itália, que por muitas vezes solicitara a remessa desse retrato, agradecendo-a por ofício, acrescentou que lhe era grato erigir-lhe aquele primeiro monumento.

     Voltando a Florença, continuou o grande artista a trabalhar incessantemente, sendo numerosa a lista dos quadros que fez de 1878 a 1882. Eis os mais importantes: A Batalha de San-Martino, Menina espanhola de 1600, Os filhos de Eduardo 4º de Inglaterra, D. Inês de Castro, Judite e a cabeça de Holofernes, D. Catarina de Ataíde, D. João 4º Infante, A noite acompanhada dos gênios do amor e do estudo, Joana D'Arc, Menina pintora, Jocabed levando ao Nilo seu filho Moisés, O voto de Heloisa, Moema, etc. Para a grande exposição de 1884, mandou muitos desses quadros. Em princípios de 1885, seguiu para a França e, depois de algum tempo, chegou ao Brasil, vindo de assumir o exercício da sua cabeça de desenho.

     Em fins desse mesmo ano, foi à cidade de São Paulo, com o intento de pintar uma tela comemorativa da Proclamação da Independência. A 14 de janeiro de 1886 firmava o contrato com o Governo do Estado para executar o trabalho dentro de três anos.

     Voltou à Itália e, no curto espaço de um ano, levou ao fim a execução do trabalho. Veio ao Brasil fazer a entrega do quadro, a que denominou de Proclamação da Independência, depois de tê-lo exposto em Florença, em 8 de abril de 1888. A 14 de julho desse mesmo ano, foi a tela entregue ao Estado de São Paulo.

     Em começo de 1889, voltou à Europa, onde continuou a pintar vários trabalhos, entre os quais, Voltaire abençoando o neto de Franklin, em nome de Deus e da Liberdade, quadro que o artista veio pessoalmente, em 1890, oferecer ao governo de seu país.

     Eleito, nesse mesmo ano, deputado ao Congresso Constituinte, por seu Estado natal, resolveu deixar definitivamente a sua residência em Florença e vir para o Rio de Janeiro. Daí em diante, só voltou ao velho mundo por motivo de moléstia. Na sua predileta Itália, já melhorado, começou o artista, em 1893, vários estudos históricos, concluindo o Tiradentes esquartejado, que trouxe para o Rio, onde o expôs.

    Ainda em 1893, pintou A visão de Hamlet. De 1892 a 1895, produziu outros trabalhos, dentre os quais citaremos o busto de muçulmano, intitulado Abd-ur Rohman e o Noviciado.

      Em 1897, pintou o quadro Honra e Pátria. Pintou, depois, a grande tela alegórica Paz e Concórdia, que foi seu último trabalho. Este quadro orna o peristilo [PERISTILO s.m. Arquit. Galeria de colunas isoladas, em torno de um edifício ou de um pátio. / Conjunto das colunas da fachada de um edifício.] do palácio do Itamarati.

     Foi, Pedro Américo, um pintor de batalhas, retratista, pintor decorativo, histórica e pintor bíblico. Em que gênero mais soube acentuar a sua individualidade artística? Onde mais conseguiu realçar o seu gênio: nas grandes concepções das cenas bíblicas, na interpretação dos fatos históricos, ou nas disposições dos grandes feitos bélicos? A resposta verdadeira será que foi grande em todos os gêneros que buscou interpretar. Num, porém, se firmaram as suas extraordinárias qualidades de artista. Foi o gênero bíblico. E isso mesmo ele o sentira e o manifestara quando, em 1864, escrevendo a Vítor Meireles, assim se exprimiu:

     "Minha natureza é outra. Não creio dobrar-me com facilidade às exigências passageiras dos costumes de cada época, que também são uma das fontes em que um talento como o seu pode achar pérolas. A minha paixão, só a história sagrada a sacia."

     Não foi apenas um pintor célebre. Foi também cultor de filosofia, homem de ciência, orador, poeta e romancista. Em tudo, soube manifestar a superioridade do seu talento privilegiado.

     "Tipo genuinamente brasileiro, escreve o distinto dr. Cardoso de Oliveira, de mediana estatura, franzino, moreno e pálido, olhos e cabelos pretos, ar melancólico e sereno, rosto expressivo e caracterizado por largas sobrancelhas, basto bigode e uma inseparável luneta, tal é, em largos traços, o modesto aspecto físico de tão grande vulto."

     Pedro Américo faleceu a 7 de outubro de 1905, na cidade de Florença.

     Tendo o governo do Estado da Paraíba pedido a entrega do corpo do seu grande filho, foram os despojos mortais do artista transportados para a terra natal, que lhe acaba de erigir um monumento.

     Da sua vasta produção, pertencem à nossa Escola de Belas Artes os seguintes quadros: Batalha de Avaí, A Carioca, Joana D'Arc, Judite, D Catarina de Ataíde, D. João 6º, Heloisa, A rabequista árabe, Virgem dolorosa, Jacober, David e Abisak, Voltaire, Retrato do Conselheiro Lopes Neto e Sócrates afastando Alcebíades do vício.

Pedro Américo

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